Se eu sobrevivi a esta reunião de condomínio, vocês também conseguem.
Quem mora em apartamentos sabe que a parte menos bela da coisa é existir um condomínio. E é menos bela não pelo pagamento (coisa que faz bastante sentido, a meu ver, e que, se bem gerida, é uma boa segurança para imprevistos), mas pelas decisões importantes que se têm de tomar em conjunto. Se estivermos a falar de pessoas civilizadas e sensatas, as reuniões têm tudo para correr bem. Se tal não for o caso - que é o mais provável - a coisa tende a roçar a briga de bairro.
Na passada sexta feira, tivemos a terceira reunião de condomínio deste ano, para tentar fi-nal-men-te decidir avançar para obras. Relembro que o nosso apartamento foi o único, no conjunto de quase duas dezenas deles, a ter tido problemas de infiltrações que duraram cerca de um ano, até termos (eu e o J., porque ninguém se mexe quando não lhe chove em casa) encontrado uma empresa que nos solucionou - pelo menos, no imediato - o problema. Desta vez, as obras que precisavam de uma decisão definitiva eram para todo o prédio, passado o período de teste que aqui as vossas caras cobaias tiveram o privilégio de viver e ultrapassadas as dúvidas que poderiam existir.
Só que - claro! - nunca há reuniões 100% pacíficas. As nossas são sempre muito longas, mas genericamente têm contado com alguma sensatez e participação e todos acabam, de uma forma mais ou menos acentuada, por se dar bem e ir para as respetivas casas a sorrir e a fazer leves piadas. Ou seja, ainda valia a pena acreditar num mundo bom.
O volte face ocorreu, todavia, nesta tão prazeirosa reunião de condomínio na sexta feira, em que uma proprietária de uma loja começou a "disparar" em todas as direções, a ser grosseira, provocatória e mal educada e a manifestar o verdadeiro tamanho do seu caráter. [Que caráter?] Estava toda a gente a ficar nervosa, sem paciência e pronta a explodir com ela. Foi vergonha alheia do pior. A coisa ficou bem turva, quando ela disse que se estava pouco a importar para o prédio e só queria que lhe resolvessem o problema da loja, que isso é que interessava. Pronto, estava tudo dito. Eu sou uma pessoa calma e pacífica - mas só até me "pisarem os calos". Fui enchendo, enchendo, enchendo... até ela se virar para mim. E aí teve a sua resposta. Enquanto gritava para mim, à minha frente, me apontava o dedo e me mostrava uns olhos esbugalhados cheios de raiva, comentou que eu era mal educada e começou a fazer imitações de mim a falar. Não sabe com quem se meteu. Levantei-lhe a voz, obriguei-a a calar-se por momentos e ouviu, da minha voz possuída de nervos, que ela, sim, era uma mal educada e uma ingrata, porque as pessoas estavam naquela reunião há duas horas a discutir o problema dela, quando o objetivo era discutir as obras para todo o prédio (coisa que demorou 10 minutos no todo, se tanto), pelo que deveria reconhecer isso, ao invés de atacar tudo e todos e comprometer o sucesso da decisão conjunta, que depende do dinheiro de todos. E acrescentei que na nossa casa choveu nos quartos durante um ano. Não foi uma loja que ficou danificada, foram dois quartos. Foi a nossa vida de recém casados. Foi a incapacidade de usufruir de uma casa acabada de comprar. Foi a nossa saúde (estivemos doentes diversas vezes nesse ano). Foi o nosso bem estar. Foram os nossos projetos adiados. Foi a nossa felicidade. E ela calou-se. Ficou a bufar, mas calou-se finalmente. Ao fim de duas horas.
Se bem que eu seja apologista da calma, cortesia e sensatez para lidar com tudo e com todos, aqui não foi possível. E acho que o que resolveu a questão foi ela perceber que não ia apanhar moscas com vinagre, e não - como idealmente seria desejável - uma carga de bom senso que tenha descido sobre a sua cabeça. [Era pedir demais, Deus não é assim TÃO magnificente]. Como não há milagres, o meu mais profundo desejo é não voltar a ver a cara desta mulher tão cedo à minha frente e que ela passe a fazer parte daquela camada da sociedade que não vai às reuniões de condomínio. Não faz falta nenhuma, reduz o risco de sofrer de um AVC e até ganha menos cabelos brancos. Só coisas boas.